Todo funcionário trabalha com o propósito de comprar o carro novo e viajar no fim de ano com a família para curtir as férias tão merecidas.
O trabalhador aqui consegue. Com muitas dificuldades e economias forçadas durante anos, realiza o sonho tão almejado, o carro novo.
Improvisou uma garagem para guardar a sua preciosidade. Recomenda à mulher para não deixar as crianças brincarem por perto e vai para o trabalho de ônibus poupando assim surpresas desagradáveis.
Aquele monumento ali na área foi muita novidade para a pequena com quatro anos de idade e levou sua boneca para apreciar também. Que tal brincar de casinha? No espelho retrovisor mirava os cabelos, fazia maquiagem e sorria falando alto com a boneca.
Para se ter uma casa de verdade era preciso demarcar os espaços. Metade do carro seu e metade da boneca. Pensou, pensou... Um prego ajudaria.
E inconscientemente ela forçou a mãozinha, o prego afundou e as divisas foram feitas. Brincou feliz toda a tarde e depois do lanche abraçada à boneca dormiu satisfeita. No seu sono tranqüilo não podia imaginar o mal que estaria por vir...
A tardinha chega cansado o dono do carro. Ao passar pela garagem quase desmaiou. Seu carro novo todo arranhado e riscado! Sentiu-se mal e começou a gritar. Mãe e filhos acodem assustados. Ele berra apontando para o carro:
- Quem foi, quem foi?
A pequena baixa a cabeça se confessando. Ele a agarra pelos cabelos e a sacode perguntando:
- Por que, por que?
Ela aponta para debaixo do carro chorando. A arma do crime estava lá: um prego enorme e enferrujado, maldito!
Como um autômato ele pega o prego e risca a mão da menina que grita indefesa. Quando a mãe conseguiu livrá-la a mãozinha já estava bastante machucada. No hospital a febre alta, convulsões e o diagnóstico – tétano. Só amputando a mão ela poderia sobreviver. E o que tinha de ser foi feito.
Passaram-se os dias, é Natal. Naquela casa sombria, triste e sem festa o Papai Noel não deu as caras.
A família reunida mas ninguém dizia nada, não havia o que falar...
A menina sai do quarto, ainda tem o braço na tipóia. Observa as pessoas e se sente culpada por aquele clima triste. Olha a lacuna onde foi mão e caminha até o pai o abraça e gaguejando diz:
- Papai, perdoa, quando minha mãozinha crescer de novo não vou mais riscar o seu carro novo...
Como se todo o universo desabasse sobre ele, o pai não conseguiu dizer nada e só as lágrimas rolaram amargas...
Saiu cabisbaixo e andou pelas ruas até à madrugada...
Não ouviu os sinos...
O sol já clareava o dia vinte e cinco de dezembro quando o encontraram sem vida e todo coberto de neve...
E o Papai Noel não veio.